“Fui diagnosticada com transtorno afetivo bipolar aos 16 anos. Já fiquei internada algumas vezes por entrar em crises. A fase da mania é algo muito forte, uma mudança brusca de humor, que me levava a sair de casa e andar horas sem rumo, falando sozinha e cheia de energia. Uma situação difícil de lidar sem ajuda médica. Meus três irmãos também possuem o mesmo transtorno”, conta Maria Raquel de Araújo, de 33 anos.
Atualmente, ela é acompanhada pelos especialistas do Hospital Dia Lugar de Vida, serviço para pessoas com transtornos psiquiátricos que apresentam quadro de saúde estável, do Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto (HSM), unidade da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa). “Há cinco meses venho sendo assistida pelos profissionais deste hospital: psiquiatras, psicólogos, enfermeiros, nutricionistas, assistente social. Tenho melhorado muito, nunca mais entrei em crise. Não deixo de tomar os medicamentos e seguir as orientações de cada um deles. Já tenho planos de fazer um curso de confeitaria assim que receber alta”, planeja.
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o transtorno afetivo bipolar atinge atualmente cerca de 140 milhões de pessoas no mundo e é considerado uma das principais causas de incapacidade, pois provoca uma mudança drástica no comportamento e nas relações sociais do indivíduo, comprometendo sua funcionalidade. Em 2024, foram internados 2.276 pacientes diagnosticados com transtorno bipolar no HSM. Na Emergência, foram recebidas 22.081 pessoas com a doença. Esta é a segunda maior demanda de internação e terceira maior ocorrência de atendimento na emergência da unidade hospitalar.
O psiquiatra David Martins explica que esse distúrbio psiquiátrico é caracterizado pela alternância de episódios de depressão e euforia, podendo afetar crianças, jovens e adultos. “A pessoa diagnosticada com esse transtorno alterna fases de depressão (alguns casos graves com ideações suicidas) com outras fases de momentos maníacos ou hipomaníacos. “Nessas situações de euforia, o paciente se apresenta com mais energia, pensamento acelerado, fazendo mais planos, com menor necessidade de sono, muito falante, gastando mais dinheiro e irritado. Isso pode durar dias, semanas e até meses”, detalha.
“Já na fase depressiva, observamos tristeza, pouca energia, falta de esperança, ficando totalmente o oposto do que estava. Em geral, as pessoas com transtorno bipolar ficam muito mais tempo no polo depressivo do que no polo maníaco ou hipomaníaco. Muitas vezes, as famílias procuram o atendimento psiquiátrico no momento depressivo, porém é necessário investigar se, ao longo da vida, foram registrados episódios de euforia”, alerta Martins.
O especialista destaca que existem dois tipos de transtorno bipolar. No tipo 1, o paciente demonstra delírios de grandeza na fase hipomaníaca. Já no tipo 2, costuma apresentar uma euforia branda, que, muitas vezes, pode passar despercebida. O psiquiatra aponta a genética como a principal causa do TAB. “Se você tem um pai e uma mãe bipolar, a chance de ter um filho bipolar é de 50%. Nós também percebemos o histórico de doenças mentais graves em familiares dos pacientes; às vezes, até pulam gerações, mas a carga genética é muito alta e, ao longo da vida, podem ocorrer fatores estressores que disparam a doença”, afirma.
Os casos graves são atendidos na Emergência do HSM e podem levar à internação. O tratamento é realizado no Ambulatório do Humor. Os pacientes são acompanhados por profissionais residentes junto aos preceptores, com assistências psicológica e psiquiátrica, inclusive com prescrição de medicações.
“O transtorno bipolar é uma doença cíclica e, se não for tratada, pode trazer muitos problemas para a pessoa ao longo da vida. Dentre os pacientes psiquiátricos, os que apresentam transtorno bipolar têm uma alta taxa de possibilidade de suicídio. Então, sem uma terapia adequada, pode haver prejuízos no trabalho, nos relacionamentos amorosos, familiares e nos convívios sociais”, orienta Martins.
Para ter acesso ao equipamento pela primeira vez, é necessário encaminhamento de uma unidade básica de saúde. Após triagem no Ambulatório Geral do HSM, se confirmado diagnóstico, os casos graves seguem para o Ambulatório de Transtorno de Humor.
Organizado pela Coordenação de Psicologia do HSM, o BipoMarço será um encontro voltado para o aprimoramento do conhecimento sobre a doença. “O evento tem como objetivo promover o conhecimento e a conscientização sobre o Transtorno Afetivo Bipolar, abordando aspectos históricos, clínicos, farmacológicos e terapêuticos, contribuindo para a formação e atualização dos profissionais de saúde”, afirma o coordenador do Serviço de Psicologia do HSM, Wesley Ramos.
Serão realizadas palestras ministradas por especialistas da área: David Martins de Araújo, médico psiquiatra, vai falar sobre Manejo Clínico e Farmacológico do Transtorno Afetivo Bipolar; Raphaela Nobre Rafael, psicóloga, sobre Intervenções Terapêuticas no Transtorno Afetivo Bipolar; e Wesley Soares Ramos, coordenador do Serviço de Psicologia, que vai falar sobre a História do Transtorno Afetivo Bipolar.
O evento será realizado no dia 20 de março, das 14h às 16h, no auditório principal do HSM e será conduzido por meio de palestras expositivas e interativas, seguidas de momentos para perguntas e discussões com os participantes.
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