Curiosidade é a marca registrada de toda criança. Por que o céu é azul? De onde vêm os dinossauros? Por que o mar é salgado? E nem sempre a gente tem resposta para tudo. Mas é na ciência que boa parte desses “porquês” encontram respostas, por isso é tão importante estimular o letramento científico ainda na infância, abrindo portas para um futuro cheio de possibilidades.
É isso que o Governo da Paraíba por meio da Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Ensino Superior (Secties) tem fomentado. A divulgação científica e o letramento científico têm sido um dos pilares dessa política que faz com que as novas gerações aprendam e se conscientizem do papel que a ciência tem no dia a dia.
Uma das ações que resulta dessa política é a Olimpíada Brasileira de Robótica (OBR), que teve a etapa nacional na Paraíba em agosto deste ano. O Governo da Paraíba, por meio da Secties, investiu cerca de R$ 200 mil para a realização do evento, com o apoio da Prefeitura Municipal de João Pessoa e Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
A Escola Municipal de Ensino Fundamental Major José de Barros Moreira, no Bairro dos Ipês, em João Pessoa, foi uma das escolas que tiveram alunos premiados. A equipe intitulada de “Major Bots 2” foi a vencedora do nível 1 da modalidade robótica de resgate.
Nativos digitais, as crianças e adolescentes hoje convivem com aparelhos eletrônicos o tempo todo, mas, segundo o professor de robótica Antônio Alves Mangueira, os jovens precisam de orientação e monitoramento. Até mesmo para compreenderem a dimensão da oportunidade que estão vivendo.
Considerando a sua experiência em sala de aula, o professor Antônio observa o contexto social dos alunos da escola. “A maior parte deles não tem os núcleos familiares estruturados, sofrem com as más condições financeiras, consequentemente não se alimentam direito. E mesmo que tenham um celular nas mãos, não quer dizer que dominem a tecnologia, pelo contrário, acabam se tornando reféns dela”, avalia.
Os integrantes da equipe “Major Bots 2” irão representar a Paraíba na etapa nacional da OBR, que acontecerá em novembro, em Goiás. Nilton Gabriel G. da Silva e Lucas F. Cardoso de Almeida, ambos com 13 anos, fazem parte do grupo premiado e passaram a entender a função de um resistor para um circuito elétrico, o que é um led, um positivo/negativo depois de manipularem o software arduíno, as ferramentas e peças de tecnologia. Por outro lado, o professor de ciências ensina esses conceitos em classe.
Durante a aula prática, eles estavam preparados para fazer uma garra para o robô que será levado para a competição em Goiás. “Eu nem sabia que essas coisas existiam, que dava pra gente fazer robô”, disse Nilton Gabriel. Da mesma forma, o colega Lucas confessou que nunca tinha mexido em um computador, nem tinha visto uma lousa inteligente, um óculos virtual, recursos à disposição. “Eu sempre tive medo de usar essas coisas (cabos, resistores, placas...), de queimar e ter que pagar!”, falou Lucas rindo.
Para os estudantes, a ciência ainda é encarada como se fosse algo um pouco distante. “Mas para chegar a esse robô de competição vocês não tiveram que fazer um projeto, fazer experimentos, testes, usando um método?” “Sim”, responderam Nilton e Gabriel. “Então, isso é um exemplo de fazer ciência. Quais cientistas vocês conhecem?” “Einstein!”, respondeu Lucas depressa. “Nicolas Tesla!”, emendou Nilton.
Dentre as aulas tradicionais, os alunos têm a oportunidade de aprender robótica e práticas da “cultura maker”, que incentiva a criatividade e a experimentação. É neste momento que o estudo parece brincadeira de criança, tal é a diversão e o envolvimento. Mas o aprendizado orientado é levado tão a sério que é desta escola a equipe campeã estadual da Olimpíada de Robótica.
Além do troféu, a escola teve mais três projetos aprovados para apresentação: da tornozeleira eletrônica com sensor de aproximação; o de lixo inteligente e um projeto de sensor de gás, para detectar vazamentos.
Importância do fomento da ciência ainda na infância
Além da OBR, a Secties também realiza programas de fomento ao letramento científico ainda na infância, a exemplo do PraCiência e a Olimpíada Paraibana de Matemática.
O PraCiência na Praça é uma exposição pública de atividades voltadas à Ciência a fim de despertar o interesse e a curiosidade dos estudantes e da sociedade sobre os biomas da Paraíba, sua diversidade, valoração e restauração. A exposição aconteceu em julho deste ano, em João Pessoa. A exposição discutiu a riqueza da fauna e da flora nordestina e como a educação científica pode promover a conservação e a restauração ambiental concomitantemente à produção sustentável.
Já o PraCiência LAB está acontecendo até novembro na Paraíba com visitas mediadas a museus, laboratórios e espaços de divulgação científica, com o objetivo de ressaltar a importância da educação de base para o desenvolvimento da Ciência e da Sustentabilidade Socioambiental. As visitas são destinadas a grupos escolares, de professores, pesquisadores e/ou profissionais da área do Meio Ambiente.
O Secretário da Secties, Claudio Furtado, é um dos exemplos de como o estímulo da ciência ainda na infância faz a diferença. Ele contou que começou a despertar um interesse pela ciência ainda criança, através da história de Einstein e Tesla. Naquela época, as informações demoravam para chegar à cidade sertaneja de Sousa, onde Claudio Benedito morava quando criança. Na época, ele descobriu a existência de estudos sobre energia nuclear procurando reportagens em bancas de jornais. O encanto se formou e, desde cedo, o garoto resolveu que iria estudar Física Nuclear.
O próprio Claudio Furtado, hoje físico renomado internacionalmente e atual secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Ensino Superior da Paraíba, explica com mais detalhes como foi essa trajetória:
“Nos anos 70 o Brasil desenvolvia o programa nuclear brasileiro em parceria com a Alemanha. Então se falava muito na questão da corrida armamentista entre Estados Unidos e a União Soviética e nós tínhamos uma pauta de energia nuclear e ciência nuclear que era constante. Então eu comecei, ainda criança, a ler sobre essa questão de energia nuclear e, eu devia estar, acho que hoje seria o oitavo ano, mas eu cheguei à conclusão de que queria fazer engenharia. E comentava com os amigos, com os vizinhos, o pessoal da família”, disse.
Ele comentou que a maioria das pessoas só pensava em física nuclear como uma coisa associada à bomba nuclear. “Então você cria um mundo na sua cabeça, do que seria fazer Engenharia Nuclear e isso marcou. Geralmente nessa fase de criança você tem uma questão de pensar, divagar, inventar um futuro e de sonhar, né? Acho que uma das maiores características de ser criança é que você sonha e os sonhos não tem barreiras.”
Hoje Claudio Furtado é professor no Departamento de Física da Universidade Federal da Paraíba, atual Secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Ensino Superior da Paraíba e consta entre os 2% dos cientistas mais influentes do mundo, conforme ranking internacional divulgado em setembro deste ano pela editora Elsevier.
Estudantes têm domínio sobre a tecnologia
Um dos projetos a ser apresentado para a banca nacional na OBR envolve uma tornozeleira eletrônica com sensor de aproximação. Os alunos e o professor Antônio Mangueira demonstraram como funciona, através de testes. Com um alarme a ser disparado com a aproximação, Mangueira explica que “o estudante que estava com o “chip do agressor” chegou na distância limite do “chip da vítima” e o sensor detectou essa aproximação”, o que fez o alarme apitar.
Além de desenvolver tal projeto, os estudantes se empolgam com outras atividades recebidas em sala de aula. “Nós estamos fazendo um cofre para usarmos no nosso projeto de economia”, explicaram as estudantes Ana Vitória Bezerra e Joyce Nascimento. O trabalho é desenvolvido nas aulas de Matemática e complementado com os produtos feitos nas aulas “maker”. Essa sala especial possui impressora 3D, impressora de preenchimento e de corte, uma bancada considerada “dos sonhos”, por conter todo o tipo de ferramentas úteis para a montagem de robôs, de placas, de cofres e do que mais a imaginação criar. Tudo ao alcance dos alunos.
“A tecnologia nas mãos das crianças e adolescentes certamente contribui para o desenvolvimento deles, mas somente na condição de estarem sendo direcionados e monitorados, senão eles sempre estão sujeitos ao inverso, a serem dominados pela tecnologia”, alerta o professor Antônio Alves.
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