Gert-Jan Oskam residia na China em 2011, quando sofreu um acidente de moto que o deixou paralisado da cintura para baixo. Agora, por meio de uma combinação de dispositivos, os cientistas concederam a ele o controle novamente sobre a parte inferior do corpo.
"Por 12 anos, tenho lutado para me reerguer", declarou Oskam durante uma entrevista coletiva na terça-feira. "Agora, aprendi a caminhar normalmente, de forma natural."
Num estudo publicado na quarta-feira na revista Nature, pesquisadores suíços descreveram implantes que estabeleceram uma "ponte digital" entre o cérebro de Oskam e sua medula espinhal, contornando áreas lesadas. Essa descoberta permitiu que Oskam, de 40 anos, ficasse em pé, caminhasse e subisse uma rampa íngreme com a ajuda de um andador. Mesmo após mais de um ano da inserção do implante, ele manteve essas habilidades e apresentou sinais de recuperação neurológica, conseguindo andar com muletas mesmo quando o implante estava desligado.
"Capturamos os pensamentos de Gert-Jan e os traduzimos em estímulos para a medula espinhal, restabelecendo o movimento voluntário", afirmou Grégoire Courtine, especialista em medula espinhal do Instituto Federal Suíço de Tecnologia, Lausanne, um dos líderes da pesquisa, durante a coletiva de imprensa.
Jocelyne Bloch, neurocientista da Universidade de Lausanne, responsável por implantar o dispositivo no Sr. Oskam, acrescentou: "No começo, isso parecia algo saído de ficção científica para mim, mas agora se tornou realidade."
Andrew Jackson, neurocientista da Universidade de Newcastle, que não participou do estudo, comentou: "Isso levanta questões interessantes sobre autonomia e a origem dos comandos. Continuamos a desafiar a fronteira filosófica entre o cérebro e a tecnologia."
O Dr. Jackson acrescentou que os cientistas há décadas teorizavam sobre como conectar o cérebro a estimuladores da medula espinhal, mas essa foi a primeira vez que alcançaram sucesso em um paciente humano. "É fácil dizer, mas muito mais difícil de realizar", disse ele.
Para obter esse resultado, os pesquisadores inicialmente implantaram eletrodos no crânio e na coluna de Oskam. Em seguida, utilizaram um programa de aprendizado de máquina para observar quais áreas do cérebro se ativavam quando ele tentava mover diferentes partes do corpo. Esse decodificador de pensamentos foi capaz de associar a atividade de determinados eletrodos a intenções específicas: uma configuração acendia sempre que o Sr. Oskam tentava mover os tornozelos, enquanto outra se ativava quando ele tentava mover os quadris.
Em seguida, os pesquisadores utilizaram outro algoritmo para conectar os implantes cerebrais e espinhais, configurando-os para enviar sinais elétricos para diferentes partes do corpo, desencadeando movimentos. O algoritmo levava em consideração pequenas variações na direção e velocidade de cada contração e relaxamento muscular. Como os sinais entre o cérebro e a coluna eram transmitidos a cada 300 milissegundos, o Sr. Oskam conseguia ajustar rapidamente sua estratégia com base no que estava funcionando ou não. Na primeira sessão de tratamento, ele conseguiu contrair os músculos do quadril.
Nos meses seguintes, os pesquisadores adaptaram a interface cérebro-espinha para se adequar melhor a ações básicas, como caminhar e ficar em pé. O Sr. Oskam desenvolveu uma marcha que aparentava ser saudável e foi capaz de subir degraus e rampas com relativa facilidade, mesmo depois de meses sem tratamento. Além disso, após um ano de tratamento, ele começou a perceber melhorias significativas em seus movimentos, mesmo sem o auxílio da interface cérebro-espinha. Os pesquisadores documentaram essas melhorias em testes de sustentação de peso, equilíbrio e caminhada.
Atualmente, o Sr. Oskam consegue andar de forma limitada em sua casa, entrar e sair de um carro e até mesmo fazer uma parada em um bar para tomar uma bebida. Pela primeira vez, ele sente que está no controle.
Os pesquisadores reconhecem algumas limitações em seu trabalho. É difícil distinguir intenções sutis no cérebro e, embora a interface cérebro-espinha atual seja adequada para caminhar, o mesmo não pode ser dito sobre a restauração do movimento da parte superior do corpo. O tratamento também é invasivo, exigindo múltiplas cirurgias e horas de fisioterapia. O sistema atual não consegue corrigir todas as formas de paralisia da medula espinhal.
No entanto, a equipe está esperançosa de que novos avanços tornem o tratamento mais acessível e sistematicamente eficaz. "Esse é o nosso verdadeiro objetivo", afirmou o Dr. Courtine, "tornar essa tecnologia disponível em todo o mundo para todos os pacientes que precisam dela".
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